terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Paulo Rezzutti - Titília e o Demonão

Foto: Maiara Alves
Títilia e o Demonão - Cartas Inéditas de D. Pedro I à Marquesa de Santos
Autor: Paulo Rezzutti
Editora: Geração Editorial
Páginas: 352
Gênero: História do Brasil

Sobre: Cartas do Imperador Dom Pedro I para a Marquesa de Santos que se imaginavam desaparecidas foram encontradas, quase dois séculos depois, pelo autor, num arquivo dos Estados Unidos, e revelam aspectos insuspeitados da vida sexual e política na corte imperial. Este livro vai ser um acontecimento na pesquisa histórica nacional. Transcritos e comentados com erudição ímpar, esses documentos profundamente humanos e de alto valor histórico nos mostram um jovem monarca impetuoso e apaixonado, bem humorado, que escreve coisas libidinosas à amante, tenta acalmar as crises de ciúme dela e tem também seus acessos emocionais. O livro revela um rico painel da vida cotidiana e política e dos costumes do Brasil durante o Primeiro Reinado.

Opinião: Em meio a instabilidade política que assolava o Brasil do início do séc. XIX, as negociações para validar o grito da Independência, a guerra da Cisplatina e as inúmeras revoltas que ameaçavam dividir o Brasil, D. Pedro vivia um dos seus romances extraconjugais mais conhecidos e comentados até hoje com Domitila de Castro Canto e Melo, a quem por capricho, amor e devoção, a nomeou camarista da Imperatriz (abril de 1825 após um vexame em público), Viscondessa de Santos (outubro de 1825) e finalmente - e como é mais conhecida - Marquesa de Santos (1826).

Domitila de Castro Canto e Melo nasceu em São Paulo, em 1797; aos quinze anos casou-se com o alferes Felício Pinto Coelho de Mendonça, então com vinte e quatro anos. O casal teve três filhos e um casamento tumultuado com diversos términos, conciliações e maus tratos. Domitila de Castro queixava-se à família que o marido a maltratava constantemente, seu bisneto José Tobias de Aguiar conta que “no afã de tirar seu ar aristocrático, obrigava-a a servir à mesa como uma serviçal qualquer, isso em pleno regime escravocrata” (REZZUTTI: 2010). Em 1819 seu marido, Felício Mendonça, a esfaqueou por suspeita de infidelidade, o autor nos lembra que era comum na época “o homem lavar a honra com o sangue da mulher adúltera”. O divórcio foi emitido em 1824 com intervenções do Imperador, obviamente, e a futura Marquesa ficou com a guarda das crianças.

D. Pedro e Domitila de Castro se conheceram em 1822, às vésperas do grito da Independência (grito da Independência este que só foi reconhecido por Portugal em 1825 que, além de pagar uma quantia considerável que deu início a divida externa, teve a intervenção da Inglaterra que visava a prorrogação do tratado que lhe concedia benefícios comerciais desde 1810 – conseqüência do acordo da escolta da família real portuguesa que fugia para o Brasil das tropas de Napoleão, em 1808) e segundo Paulo Rezzutti teriam tido sua primeira relação em 29 de Agosto do mesmo ano. Administrar as províncias de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, tentar controlar as revoltas e conflitos no restante do Brasil, o Palácio de São Cristóvão, os filhos legítimos e bastardos – e todos os feitos durante seu reinado e ainda ter tempo para a(s) amante(s) justifica a autonomeação Demonão.

O romance durou sete anos (1822-1829), o casal, durante um período, não escondeu o caso. Viajaram juntos inclusive com a Imperatriz Leopoldina, que muitíssimo bem educada fingia que não sabia de nada, consciente das suas obrigações e ouso dizer talvez a personagem mais forte e interessante do Primeiro Reinado, realmente desconheço todo o encanto em torno da Marquesa... Então, o romance durou sete anos e gerou quatro filhos (Isabel Maria, Maria Isabel, Pedro e Maria Isabel), vingando apenas Isabel Maria e a segunda Maria Isabel (três filhas com o mesmo nome, céus!).

Em 1826 Domitila se muda para perto da Quinta da Boa Vista e “assim viveria a uma distância de pouco menos que um quilômetro do amante, que do palácio, não raro, a espionaria com uma luneta” (REZZUTTI: 2010) e no mesmo ano falece D. Leopoldina. De acordo com o autor o Imperador admirava D. Leopoldina, que teve um papel importante no processo de Independência do Brasil “e no liberalismo político, apesar de ter sido criada dentro dos rigores do absolutismo austríaco”. Em um dos muitos boatos e acusações que envolvem Domitila, a morte de D. Leopoldina supostamente seria de envenenamento pelo médico a mando da Marquesa. Não duvidaria que fosse de desgosto e infelicidade... 

Após a morte de D. Leopoldina, D. Pedro solicitou ao Marquês de Barbacena que buscasse, na Europa, uma noiva. As exigências eram: virtude, cultura e beleza. O contrato foi assinado com Amélia de Leuchtenberg, princesa bávara, neta da Imperatriz Josefina, primeira esposa de Napoleão. A quarta qualidade exigida pelo imperador era nascimento, mas após tantos escândalos na corte e na Europa por causa de Domitila, esta exigência se tornou secundária. A marquesa foi expulsa pelo próprio Imperador da corte, e após veemente resistência “foi oficialmente intimada pelo ajudante de ordens do imperador para que se retirasse da corte em uma semana” (REZZUTTI: 2010).

Após o casamento de Pedro I com Amélia de Leuchtenberg e conseqüentemente seu retorno à São Paulo, Domitila de Castro casou-se com o antimarquesista (antimarquesistas e marquesistas eram os nomes dados aos grupos de pessoas que, após a volta da marquesa à São Paulo, a sociedade paulista se dividiu), “o brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, rico tropeiro sorocabano e líder do Partido Liberal, duas vezes eleito presidente da província de São Paulo” com quem teve seis filhos, o casamento durou mais de vinte anos.

Minha posição é antimarquesista (haha), de forma alguma exaltarei o romance de D. Pedro e Domitila de Castro que só é “bonitinho” devido ao Romantismo do séc. XIX, fiquei muito curiosa pra saber se D. Leopoldina, como penso ser, foi vítima desde seu nascimento fadada a ser uma boa esposa, mãe e acima de tudo excelente consorte.  

Quotes
Junto com propriedades, jóias, títulos e ações, essa velha senhora deixava para a posteridade cartas recebidas de d. Pedro I ao longo dos sete anos em que foram íntimos, no sentido mais amplo do termo. Umas poucas poderia ter sido suficientes para relembrar o passado na corte, reafirmar a progenitura das filhas que teve com ele, reviver o amor e os ciúmes. Ninguém passa impunemente por uma grande paixão, e mesmo seus ecos vindos de um passado longíquo ainda podem servir para nos lembrar do quanto fomos amados, desejados e importantes para alguém. Se para isso algumas batalhas bastam, o que dizer de mais de duzentas cartas? Quis Domitila, talvez, que seu romance fosse eterno (...). Antes, porém, de deixarmos os sentimentos do imperador transbordarem novamente, fazendo os amantes reviverem uma vez mais, vamos abandonar o corpo que começa a esfriar em um palacete na antiga rua do Carmo, no centro de São Paulo, e vê-lo ressurgir jovem, saudável, repleto de vida, às vésperas da Independência Brasileira.
 (Pág. 24)

O vértice mais fraco do triângulo amoroso partia-se. Ainda no sul, ao saber da morte da esposa, D. Pedro escreveu um poema lamentando sua perda. Em um trecho, diz: “Ela me amava com o maior amor/Eu nela admirava a sua honestidade.” Ele tinha certeza que D. Leopoldina o amava, porém ele tinha por ela somente admiração. Admirava a mulher que, além de ser mãe de seus filhos, havia embarcado com ele na aventura da Independência do Brasil e no liberalismo político, apesar de ter sido criada dentro dos rigores do absolutismo austríaco. D. Leopoldina era muito mais culta, educada e preparada que D. Pedro. Além de trocar correspondência com naturalistas na Europa e receber visitantes estrangeiros que aportavam no Brasil, servira de intérprete ao marido diversas  vezes junto aos militares alemães que vieram ingressar nas tropas de mercenários estrangeiros. Seu importante papel na Independência junto às cortes européias no reconhecimento do novo estado americano é inegável.
 (Pág. 61)

Quotes Cartas
(...) ontem mesmo fiz amor de matrimônio para que hoje, se mecê estiver melhor e com disposição, fazer o nosso amor por devoção. Aceite, meu benzinho, meu amor, meu encanto e meu tudo, o coração constante/ Deste seu fiel amante/ O Demonão
 (Pág. 104)

(...) não lhe pareça, meu amor, que esta linguagem é da boca para fora ou filha da astúcia ou da velhacaria própria dos falsos amantes: mas não é. É filha do meu coração arrependido que todo se derrete em amor quando se lembra que de tão longe mecê veio, e que tanto tempo ausente se mostrou constante.
(Pág. 161)

(...) vou fazer a barba para mecê não ser arranhada à noite por / Este seu desvelado, agradecido, fiel, constante e verdadeiro amante/ O Imperador
(Pág. 178)

"Filha, pelo amor que tens a nossas filhas, não me faças por tuas inconsideradas expressões (e por mim não merecidas) atormentar-me eu. Filha, estou (pergunta a teu mano João) com a cara mais abatida, e muito mais ficará se em lugar de receber de ti agradáveis expressões eu na tua carta achar o contrário. Filha, eu te quero muito, tu bem o sabes, e se te não quisesse nada te diria, nem excogitaria todos os dias modos e entradas para te ir ver."
(Pág. 229)


Achei a grafia do Imperador e principalmente da Marquesa bem fácil, se comparadas à outras da época, de entender. Algumas palavras e até frases, sem espiar a transcrição, consegui ler. Bom, o autor esteve no Programa do Jô, assim como Laurentino Gomes e Mary Del Priore, escritores populares de obras sobre a História do Brasil.





Agora volto a ler Os Sertões...

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